Cordel Longe do fim
Baú do cordel - A Literatura de cordel está renascendo no
Ceará. O presidente e fundador do Centro
Cultural dos Cordelistas (Cecordel), Guaipuan Vieira, comemora os esforços
tomados pela entidade para manter a tradição de aproximadamente 80 anos do
cordel no Estado. Com a morte anunciada por estudiosos da cultura popular,a
literatura de cordel, segundo ele, passa
longe fim”.
Criado em 1987, através da iniciativa
individual de Vieira, o Cecordel surgiu com a finalidade de reunir os cordelistas
de Fortaleza e reativar a produção de folhetos que desde a década de 70 estava
sumida do cenário cultural cearense. As
estratégias são mostras em escolas, centros culturais e feiras, intercambio com
bibliotecas e universidades de outras estados e realização de oficinas para
crianças e adultos, bem como uma banca para a venda dos folhetos no centro da
cidade.
A literatura de Cordel tenta aos poucos
retomar seu passo de volta ao posto de
arte tradicional e genuína representante do folclore nordestino. A
confecção de folhetos encomendados por políticos em época de eleição e por agencias de turismo, para
divulgação das atrações de Fortaleza, são outros meios que auxiliam na retomada
da produção . O cecordel funciona ainda como uma cooperativa. Da contribuição dos sócios –todos poetas – a
cada mês, através de sorteio, são publicados dois títulos de cordéis inéditos.
A entidade em 11 anos de existência, já publicou mais de 100 títulos.
“Apostamos muito em divulgação nos meios de
comunicação, como as revistas e jornais culturais”, acrescenta o presidente.
Sobre isso, ele conta um fato curioso que ocorreu no ano da fundação do
Cecordel. Nesta ocasião a rede Globo de Televisão estava no Ceará para a
gravação do especial “O Último Cangaceiro” o Cecordel foi contatado pela Globo
para emprestar alguns folhetos para a
filmagem. A entidade aceitou a tarefa e
pediu em troca apenas a divulgação do
nome do Centro nos créditos do especial. “Ensinei a atriz Letícia Sabatella a cantar os versos
de Cordel”, lembro Vieira. O especial foi gravado, os folhetos do Cecordel
filmados, atriz ensinada, mas, segundo ele, o nome não estava lá. Mesmo assim,
o Centro não perdeu o ânimo.
Uma enxurrada de estudos, dissertações e
teses em universidades de todo o País
são fatos que comprovam o interesse das pessoas pela literatura de cordel. “O
cordel cearense foi tema de teses até na Inglaterra”, festeja.(...)
Adaptação
Poeta e ex-presidente do Cecordel, Otávio
Menezes, diz que o advento e modernização do meios de comunicação, como
rádio,televisão e jornal, foram as principais causas da queda na produção
original de levar informação, entretenimento e cultura ao povo nordestino. “Dos
anos 30 à década de 60, a
informação não chegava à casa das pessoas com a rapidez de hoje e a impressão e
transporte dos jornais demorava dias”, explica. “ O cordel não está morrendo,
está apenas se adaptando à transformações
da sociedade”.
Obras como “Pavão Misterioso” e “João
Grilo” chegaram a vender cerca de 80 mil
e 10 mil exemplares, respectivamente, na década de 40. Guaipuan Vieira
calcula que hoje a produção chega no máximo a mil folhetos. Antigamente, os
próprios poetas viajavam léguas pelo
sertão nordestino contatando e vendando seus poemas. Eles cantavam ainda com a
ajuda dos folheteiros e pontos comerciais em mercados, feiras e estações
ferroviárias.
“As cidades estão desenvolvidas,
movimentadas e as pessoas preferem assistir a TV ou ler revistas para passar o
tempo e se informar”, afirma Otávio Menezes. O surgimento
do mimeógrafo, do computador e da xerox também serviu para substituir as
antigas tipografias com suas máquinas primitivas e caseiras, denominadas
“suvaqueiras”. A produção dos folhetos hoje é basicamente domestica com a ajuda
do computador e da fotocópia. “ A literatura de cordel estava precisando de uma
reformulação para se adaptar, pois manter a tradição não é manter o atraso”
salienta.
Construção
As temáticas continuam praticamente as
mesmas de 80 anos atrás. Fatos jornalísticos do momento, acontecimentos de
repercussão nacional, como a morte de uma pessoa famosa, e notícias locais são
temas preferidos. No linguajar do cordel, são fatos “de circunstancia” ou “de
acorrido”. Menezes esclarece que a produção de temas globais foi reduzida, pois
a TV, o rádio, o jornal já dão conta disso.
Há ainda temática históricas e ficcionais.
“Não pegamos somente o ato em si, que funciona apenas com espinha dorsal.
Acrescentamos outros elementos com a rima, o humor e os gracejos”, explica.
Títulos como “ Chegada de Lampião no Céu”, Mainha, o maior pistoleiro do
Nordeste”, “A Morte do Rei do Baião” e “ A Mulher que deus à luz a seis meninas
e uma vez” são apenas alguns exemplos da extensa lista das histórias contadas.
As capas são sempre ilustradas com xilogravuras ou desenhos.
Os folhetos têm geralmente oito e 16
páginas e são narrados em estrofes com seis versos (sextilha) ou sete versos
rigorosamente metrificados. Os títulos
de ficção como temas de aventuras e amor
baseados na literatura medieval têm 32 ou 64 páginas e estão cada vez mais
raros nos dias de hoje.
Os custos para produção são altos para o
poeta que, atualmente, não lucra quase na com a venda, pois a maior parte é
distribuída. “Além disso, os folhetos longos exigem muita experiência do poeta
para a condução do fio narrativo”, esclarece Menezes. Segundo o presidente do
Cecordel, os gastos com a produção de mil exemplares comuns varia de R$180 a
R$300 e mil folhetos de ficção chegam a custar o triplo. Os leitores mais
assíduos do cordel em Fortaleza são estudantes –estimulados pelos professores
-, pesquisadores, turistas e agricultores que chegam à capital. “Os folhetos
também têm uma presença forte na região do Cariri, principalmente Juazeiro do
Norte, e em Canindé, vendidos durante as festas religiosas”, ressalta Guaipuan
Vieira. Para Otávio Menezes, os temas preferidos continuam sendo os engraçados,
jocosos e galhofeiros.
“Para atrair o leitor, o título tem que ser
interessante e criativo, ter uma boa ilustração na capa, a história linear, bem
contada., versos concatenados, bem cadenciados e rima perfeita”, acrescenta o
poeta.
Benedito Teixeira
– Gazeta Mercantil -Terça-feira,06/01/1999
Acesse: www.cecordel.com.br
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